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sábado, 25 de julho de 2009

carta ao Júlio de Grammont (ira de 2007)

Carta ao Júlio de Grammont (que Alá, o misericordioso, o tenha)

"Os bons- sempre foram o começo do fim"
Nietzsche

" Incenso Fosse Música

isso de querer
ser exatamente aquilo
que a gente é
ainda vai
nos levar além"

P. Leminski

Júlio, amigo Júlio de Grammont que estais nos céus, me ouça (ou leia):
Um dia desses fui chutado de um lugar por "não respeitar as regras", "não engolir sapos", "pular o muro" e não participar de "seleção pública". Esse pessoal ficou quase três meses para pagar meus direitos trabalhistas, mas eu suporto...sabe como é a vida: muita contradição.
Pelo que sei, você, além de bom jornalista, não lambia as botas do poder constituído. Como você eu também não faço isso (odeio concessões): não lamberei a bota de prefeito (prefiro futebol), de vereador, sindicalista, gerentes, coordenadores, assistentes, diretores, "cargos de confiança" e outras coisas. Meu lema é "antes morrer de fome do que de tédio". Fico sempre transitando pelos instantes arruinadores de hierarquias.
Ultimamente descobri que as neuroses não são doenças, são um sintoma das concessões que nossa liberdade está sujeita nesse social capitalista. Cansei desse negócio de barganhar poder (às vezes por um sálario medíocre) por prazer. Acredito na transformação do aqui e agora, não tenho paciência para esperar a revolução socialista ou um novo presidente "trabalhador".
Daqui onde eu existo continuarei mais pobre ($), mas continuarei bem eu: sempre contra o cancêr das engolições de sapos (e de pântanos inteiros, como uns gostam...); não quero empregos que, veladamente, exigem "pagar um pau" para partidos do poder; não entro em seleções ou concursos públicos que garantam até minha morte uma média salarial e, menos ainda, não farei isso babando ovo para aparelhados que depois de 20 anos de "luta" não chegaram ao socialismo,,, mas têm uma boquinha no Estado capitalista. Você era dessa gang?
Sabe Júlio, considero coisas rentáveis igrejas e partidos: são 10, 15 anos e cúpula tá rica.
Também não quero respeitar ninguém que não me respeite: de educandos ao papa. Sou feito e me faço para uns e não para todos. Amarei com intensidade quem eu queira e que me queira, não toda a humanidade. Daqui pra frente vivo só com quem me escolha e eu escolha.
Vivo por mim, para uns.
Tô fora das propostas político- peidagógicas reformistas, vivo com o coração arrastando o corpo (acho que vou morrer do coração) e não com a cabeça puxando o corpo (esses intelectuais, no máximo, vão ter caspa). Não quero formar cidadãos que se encaixem nesse capitalismo, não quero adaptar ninguém ao mundo, quero destruir o mundo, "para nascer precisamos destruir um mundo" já dizia Hermman Hesse...
Não quero viver pagando prestações de bens duráveis, não quero garantias, não quero bares que a cerveja custe 4 reais e só tenha gente limpa, branca, cristã e de chapinha. Quero a orgia e a safadeza (deixo pro padres, caretas e militares a continência). Não curto andar pela cidade trancado num automóvel como um paquiderme medroso e monogâmico e/ou celibato. Quero a ternura de viver com amigos e não por dinheiro. A poesia deve subverter o corpo, tem que ser viva e vivida. Não quero objetivos específicos, gerais, metodologia, avaliações, provões; quero amigos que percebam minhas chagas e mostrem as deles, que me vejam chorar e gozar.
A nutrição literária que quero é aquela que transforma o aqui e agora e me aproxime de mim e de quem é atraído pela órbita do meu coração. Morte a quem anda com a poesia morta na boca . Como dizia Raoul Vanegheim, quem fala de revolução, sem realizá-la no cotidiano, fala com um cadáver entre os dentes.
Pensei numa poesia do Piva pra colocar nessa carta, vê se você gosta:
A PIEDADE
Eu urrava nos poliedros da Justiça meu momento
abatido na extrema paliçada
os professores falavam da vontade de dominar e da
luta pela vida
as senhoras católicas são piedosas
os comunistas são piedosos
os comerciantes são piedosos
só eu não sou piedoso
se eu fosse piedoso meu sexo seria dócil e só se ergueria
aos sábados à noite
eu seria um bom filho meus colegas me chamariam
cu-de-ferro e me fariam perguntas: por que navio
bóia? por que prego afunda?
eu deixaria proliferar uma úlcera e admiraria as
estátuas de fortes dentaduras
iria a bailes onde eu não poderia levar meus amigos
pederastas ou barbudos
eu me universalizaria no senso comum e eles diriam
que tenho todas as virtudes
eu não sou piedoso
eu nunca poderei ser piedoso
meus olhos retinem e tingem-se de verde
Os arranha-céus de carniça se decompõem nos
pavimentos
os adolescentes nas escolas bufam como cadelas
asfixiadas
arcanjos de enxofre bombardeiam o horizonte através
dos meus sonhos
Foda essa poesia, né não?
Sou contra a revolução, ela sempre acaba por estabelecer uma ordem cheia de gente mamando eternamente. Quero eterna rebeldia, insurreição eterna, sem garantias, sem paraísos futuros: o paraíso pode ser aqui e agora e durar uma trepada ou um poema .
Tenho umas dúvidas, me ajuda aí:

Você acha que existe algum muro que não mereça ser pulado ou destruído?
Você confiaria num lugar que precisa de muros para manter as pessoas dentro?
Você não acha que gabinetes fechados produzem obesidade?
Não é estranho te excluírem de um lugar que fala de inclusão?
É impressão minha ou a normalidade cristã sempre precisa queimar alguém?
Será que não engolir sapos pode contaminar os outros a fazerem o mesmo? Será que melhoraria o mundo?
Trabalhei num lugar que rolou uma briga que parou quase uma semana as atividades normais e sabe o que aconteceu? Uma demissão? Que nada, só um remanejamento. O legal foi que ficamos sem "líderes" uns 15 dias tudo funcionou normalmente...interessante, né?
Será que essa realidade produtora de síndromes, depressões, neuroses e canceres vai prevalecer sobre os delírios de quem não quer ser rebanho?
Essa é do Antonin Artaud:
" O que se entende por autêntico louco?
É um homem que prefere tornar-se louco antes de trair uma idéia superior da honra humana.
Por esse motivo, a sociedade amordaça a todos aqueles de quem quer se livrar, ou só proteger, por terem se recusado a converter-se em cúmplices de certas imensas porcarias.
Porque um louco é, na realidade, um homem ao qual a sociedade se nega a escutar, e ao qual quer impedir que expresse certas verdades insuportáveis.
Mas, o internamento não é a arma exclusiva, porque a confabulação dos homens tem outros meios para submeter as vontades que pretendem destruir"
E sobre o Van Gogh, o A. Artaud escreve:
"(...) para um mundo que tanto de dia como de noite, cada vez mais, come o incomível para dirigir sua maléfica vontade para a realização de seus fins, cortar a orelha não passa de uma lógica direta. Sobre esse ponto não há mais remédio do que emudecer."
Os satisfeitos e os que amam a segurança são muito chatos, mas parabéns, vocês são o suporte desse mundo doente e brocha.

Desse lugar que fui chutado tenho saudades do pessoal da faxina, da Branca, da Carol, Mirian, Tati, Andeson,Fernando Sombra, Jefão, muitos educandos (as) e de todos onde meu coração pousou.

Júlio: sou fiel ao desejo. Só.

Um comentário:

  1. Ai te faço um pergunta:
    Será que o Julinho morreu de acidente de carro mesmo? Foi feita pericia no carro? Meu caro colega, Julinho erá foda, aquela estrela sabe da onde que veio? Frei Beto quem diga! Mas continuo acreditando que um dia, quem sabe, meu os teus filhos possam realmente mudar essa MAFIA.

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